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Crônica de uma bolha anunciada

 Em Notícias

Não é preciso entender muito de economia para saber que estão em formação algumas bolhas que podem estourar ao menor vacilo da economia brasileira. Recebo na web ofertas de imóveis em relação às quais a única atitude sensata seria chamar a polícia. Uns predinhos feios, outros devidamente maquiados (imagino o custo do condomínio), a preços que ferem o decoro. Compra-se um automóvel hoje com prestação de R$ 300 por mês. Você adquire um apartamento em 30 anos e já ganha, por generosidade da construtora, a cozinha — e dependendo do valor, também o carro na garage. Novos e amplos horizontes para a Petrobrás e o Ptbrás, que cada vez têm mais dinheiro em caixa para gastar. Pouco importa se a poluição decorrente vai à estratosfera, se as nossas cidades já têm trânsito em estado crítico, se as estradas se esgoelam por socorro. Vamos em frente. Aprês moi le deluge.

Enfrentamos uma situação não muito diferente no mercado de arte. Manobras secretas empurraram os valores de artistas como a Milhazes, a Varejão, o Oiticica, a turma dos concretos, para algarismos que não dá para ouvir sem estar sentado. Engasgo ao saber o quanto pedem por aquelas réplicas de Matisse e Picasso feitas em pó de veludo pelo Vik Muniz. Como é bom ser fashion e contemporâneo! Esgotado o conteúdo das sopas Campbell, há toda a historia da arte para fornecernewlooks. E castelo de revista para cenário de novos contos da carochinha.

Fico imaginando o que vai acontecer no futuro com aqueles rabisquinhos, aquelas letrasets de Mira Schendel, e pelos quais se pedem 2 e, imagino Logo mais, 3 digitos. Terão o mesmo destino das pombinhas bicadoras de Dacosta? Farão companhia aos Bonadeis a respeito dos quais nos bons tempos se falava de boca Cheia em dezenas de milhares de verdinhas? Acalentarão no colô os bichanos de Aldemir? São perguntas que ficam no ar, como a relevância de certos nomes que hoje tanto mexem com a libido da galera.

O mercado de arte parece ter contratado 2 personagens das HQ : o Professor Pardal e o Mandrake. O primeiro inventa num piscar de olhos novos nomes para a arena. E o mágico, num simples gesto, refaz preços e posições. Porquê isso acontece? Porque há um monte de gente com muito dinheiro, nervosa por depositá-lo em alguma coisa. Como arte é símbolo de status, precisa-se de grifes para demonstrar o peso da conta bancária. E grana é o Idioma mais falado no mercado dos top de linha.

A bola da vez é Burle Marx, um artista que é referência como paisagista, mas cuja obra plástica provocava raros frissons, embora tenha mantido sempre um nível entre o médio e o bom e por vezes até surpreendesse com alguma obra fora do padrão. Num ato de legitimo sobrenatural virou capa de leilão, objeto de retrospectiva. Um icone que ninguém havia percebido ser gênio, e que agora um grupo, num transe coletivo, decreta ter chegado a hora da canonização.

Desconfio que o próximo será Roberto Magalhães.

As pessoas estão comprando por ouvido, não pelo olhar. Podem vir a lamentar-se muito quando se derem conta de que arte é para ser adquirida com sensibilidade e informação, e se for para pensar em números, é preciso detectar a qualidade da obra, e em consequência, seu valor intrínseco. E não são propriamente o currículo, os elogios dos escribas de aluguel, ou o emprego avassalador de todo os truques do márquetim, que vão ditar as regras do jogo. Como disse Merleau-Ponty, “as grandes obras constroem sua própria posteridade”.