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Polêmica com a bienal de naïfs no Sesc

 Em Notícias

Confessando sentir-se como um cachorro morto prestes a ser chutado (palavras dele), o professor de geografia sr. Antonio Nascimento, inventor da Bienal de Naïfs promovida pelo SESC de Piracicaba, endereçou patética carta a A RELÍQUIA, onde me ataca a propósito de opinião contrária ao conceito de “arte naïf (sic) que ele defende com unhas e dentes. Não vou entrar na paranoia persecutória do Sr. Antonio, nem aceitar o convite para lavar roupa suja, mas estou aberto para discutir cultura.

O foco da questão não é o Sr. Antonio, contra quem nada tenho, um homem com medo de escorregar do trono. O problema é que, por ser o SESC uma entidade poderosa, competente e respeitada – capaz de estabelecer referências – os acertos e inclusive os erros que possa cometer, adquirem muito peso.

Inversamente ao que o missivista afirma, jamais pronunciei uma única palavra em favor dessa bobagem de “arte naïf” (sic), que gringos espertos nos empurraram goela abaixo, rindo de nossa cara. Sempre abominei, e o fiz de público, esse galicismo pernóstico, manquitola, afrescalhado e desnecessário, introduzido para alavancar uma estética de confeitaria e amplificar o tilintar do caixa.

Porque não dizer simplesmente arte ingênua , uma palavra tão bonita?

À um curador não se pode exigir apenas empenho e paixão, como pretende o Sr. Antonio. Curadoria requer bem mais : muita, muita cultura. Conhecimento de numerosas linguagens artísticas. Aprimoramento constante da sensibilidade e da informação. Senso crítico para distinguir com clareza o que é joio e o que é trigo. E sobretudo um curador tem que ter isenção quanto a panelinhas, bajulações e pressões mercadológicas, para não virar tudo um trenzinho de alegria. Não consigo vislumbrar no Sr. Antonio qualquer sinal desses imprescindíveis predicados. Utilizando a catalogação de mais de 500 pintores populares, repassada pelo pesquisador José Nazareno Mimessi – e que ele brande como se fosse sua – o Sr. Antonio pilota uma egotrip que não tem qualquer paridade com iniciativas sobre arte popular realizadas dentro do próprio SESC por gente como Gláucia Amaral, Lina Bo Bardi, Flavio Império e Ivaldo Bertazzo.

O resultado é que a Bienal piracicabana, mesmo tendo alguns méritos, ficou uma dispendiosa vitrine a serviço de pintorecos pré-amadores, e dos maneiristas best sellers mais manjados do mercado. Que sorte a dessa turma !

E que azar o nosso, pois mesmo tendo nas mãos as verbas do SESC, sua tradição em relação à arte popular e sua formidável estrutura, o Sr. Antonio repita a fábula do parto da montanha e não consiga sacar de tudo isso senão um desorientado camundongo. Talvez não se devesse, de um caminhãozinho de bitola estreita, provinciano e burocrático, exigir que carregue demasiada areia.

Diga-se a seu favor que no último catálogo o Sr. Antonio, até aqui irredutível na defesa da mesmice, ensaiou alguns passos desajeitados em outra direção. Até que enfim, depois de mais de uma década, alguém soprou na orelha dele que não podiam mais ser jogados para escanteio artistas como J. Coimbra, Vicente Labriola, Alcides Santos, Jair Gabriel, Elisa Mello, Irene Medeiros e Zica Bergami.

Fica a expectativa de que, decorrida talvez mais alguma década, ele venha a enxergar artistas essenciais como João Pilarski, Durval Serra, Babalú, Sérgio Vidal, Vicente Ferreira, Tio Quincas, Cincinho, Aurelino, Alcides Pereira, Lícidio Lopes, Moacir Faria, Geraldo Silva, Cidinha Pereira e outros.

Seria uma bela forma de lançar mais oxigênio nas águas poluídas pelos mediocres, os carreiristas e os copiadores, que hoje bracejam soberanos no glorioso Piracicaba.

Roberto Rugiero

Diretor da Galeria Brasiliana, especializada em arte popular de qualidade.
Rua Artur de Azevedo 520
São Paulo 05404-001 SP

(artigo não publicado pela Revista A Relíquia, 2004)